As mortes de estudantes estão a exigir respostas - Por Mauro Werkema


A morte de dois estudantes de Ouro Preto não são fatos isolados. Ou meramente casuísticos. Integram-se num mesmo contexto, numa mesma relação causal. Decorrem de uma só situação, que é a de desregramento e de libertinagem.  que impera em Ouro Preto. Vinculam-se a estas duas mortes outras, também sem apuração mas que  refletem a impunidade e que acabam por permitir, senão estimular, todos este contexto: o assassinato da advogada Valmeire, misteriosamente, na sua Direita, chamada Rua da Lama; o assassinato da estudante Aline, em circunstâncias estranhas, encontrada nua e supliciada no Cemitério da Igrejas das Mercês de Cima, em assustador ritual; ou mesmo o assassinato do ex-prefeito de Mariana, João Ramos, também sem o devido esclarecimento de autoria e execução. Juntam-se a isto várias outras pequenas transgressões, falta de cidadania e civismo, a falta de ação das autoridades, a indiferença da Universidade, a falta de ações enérgicas e de comando  da cidade e  muito mais, como todos os moradores o sabem.

É lamentável  escrever isto sobre Ouro Preto, belíssima cidade, conhecida internacionalmente, destino turístico, detentora de um acervo histórico, artístico e cultural de singular exemplaridade, inscrita nos Livros do Tombo da UNESCO como Cidade Patrimônio Cultural da Humanidade. O que houve? Como se explica o quadro atual?  Sabemos todos das virtudes cívicas da cidade, que ajudou a construir a nacionalidade brasileira, lutou pela liberdade e, em vários momentos, sacrificou seus filhos em luta contra o arbítrio. Ouro Preto não merecia estar no noticiário, como nos últimos dias, com imenso prejuízo para a sua reputação. E igualmente para suas autoridades, para sua Universidade, para sua condição de  cidade de cultura, que recebe visitantes de todo o mundo.

As “repúblicas” extrapolaram. Festas mirabolantes e mortes. Excessos de bebidas, drogas, promiscuidade. Sodoma e  Gomorra, sem limites, sem freio ou censura, a liberalidade total, em que tudo vale. É este, infelizmente, o quadro que se constata, sob protesto dos moradores, incomodados pelos festins absolutamente perturbadores do silêncio e da paz públicas. E o que é mais incompreensível: em alojamentos estudantis, em alguns prédios públicos, onde o estudo e o recolhimento deviam imperar, mesmo nas festas, próprias dos jovens, assim como a alegria é inerente ao ser humano e deve ser cultivada. A Prefeitura já tentou interditar “república”, o Ministério Público já celebrou um Termo de Ajustamento de Conduta, a Câmara Municipal  propôs discussão, a população condena e atritos são semanais, as duas polícias, Civil e Militar, se sentem  impotentes. E ações isoladas, de mera repressão pontual, já não mais adiantam.

Há um relatório elaborado pela PM que circula nos meios policiais, turísticos e culturais. Relata a situação excepcional de Ouro Preto. Adverte sobre este quadro e o pinta em cores dramáticas.  Teme por acidentes maiores nas grandes festas, como o Carnaval e o Doze de Outubro. Intervenções emergenciais, de bombeiros ou de socorro, se tornam quase impossíveis devido à massa humana que toma as ruas. O controle policial se transforma em agressões e pancadarias, como todos já vimos várias vezes. Não haveria como controlar grandes acidentes. A cidade recebe mais de 30 mil pessoas, quase metade da  população urbana. Os serviços públicos entram em pane.

Noticia a imprensa que as “repúblicas” já anunciam hospedagem para o Carnaval. Prometem serviço completo, mais do que os hotéis, com que competem. E propiciam  a folia sem limites. Deveriam recolher-se em respeito aos colegas mortos. Guardar sua memória. Mas, em geral, não revelam estes sentimentos. Já eram em meio ao comprometimento já corrompido.  A insensatez e a irresponsabilidade coletivas, incentivas pela  certeza da impunidade, escurecem as consciências. É a orgia geral, que desencadeia nos seres humanos os piores instintos e reduz, senão anula, a consciência ética. Algo precisa ser feito, em ação coletiva de todos os envolvidos, a começar pela UFOP, passando pela Magistratura,  Ministério Públicos, organismos policiais, Prefeitura e Câmara. E as lideranças estudantis, se ainda existem e têm alguma respeitabilidade. E tem que ser agora, na comoção destas duas mortes, e até em sua memória,  na antevéspera do Carnaval e de uma nova gestão municipal, como também quando se escolhe  um novo reitor.

Via:  http://www.ouropreto.com.br/noticias/detalhe.php?idnoticia=6864#.UL5v-TOFroN.facebook


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